A expressão “Lei seca” pode ter vários significados diferentes, a depender do país, sendo que é comum relacionar tal instituto, no exterior, à proibição da venda ou do consumo de bebidas alcoólicas em determinados ambientes públicos.
No Brasil, a Lei seca teve origem relacionada à proibição do comércio de bebidas alcoólicas em dias de eleição, adotada na década de 1960.
Atualmente, no entanto, ampliou-se sua conotação. Quem nunca ouviu a frase: “Se beber, não dirija”?
Pois bem, em janeiro de 2008, foi publicada a Medida Provisória nº 415, que proibia a comercialização de bebidas alcoólicas em estabelecimentos situados em rodovias federais.
Em caso de descumprimento, a medida provisória trazia como punição a aplicação de multa no montante de R$ 1.500,00.
Tal norma teve vigência pelo curto período de cinco meses e não foi aceita popularmente.
Na sequência, foi publicada a Lei nº 11.705, de 19 de junho de 2008, mais conhecida como “Lei Seca”, que veio alterar o Código de Trânsito Brasileiro, de modo a proibir a condução de veículo automotor na via pública, estando o condutor com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.
Anteriormente à publicação da Lei Seca, não existia previsão legal acerca do teor alcoólico considerado para fins de caracterização do crime, bastando, para tanto, que o motorista estivesse sob a influência de bebida alcoólica.
Posteriormente, foi publicada a Lei nº 12.760/2012, trazendo nova alteração no Código de Trânsito Brasileiro, no sentido de estabelecer a tolerância zero à ingestão de álcool pelos motoristas.
Nessa ocasião, foram alterados os fatores multiplicadores das multas da Lei Seca, passando a ser determinada a multiplicação por 10 da multa gravíssima.
Foi estabelecida a aplicação de multa no montante de R$ 2.934,70, valor este que pode ser dobrado caso o motorista for flagrado novamente dentro do período de um ano. Sem falar que o motorista deverá ter seu direito de dirigir suspenso por doze meses, bem como terá o veículo recolhido, caso não se apresente condutor habilitado e em condições de dirigir o mesmo.
Ademais, a novel lei aumentou os instrumentos de fiscalização do cumprimento da Lei Seca, passando a prever a possibilidade de utilização de provas testemunhais, vídeos e fotografias como provas de que determinado motorista se encontra sob efeito de bebida alcoólica.
Por fim, ocorreu nova modificação nas leis de trânsito, a partir da publicação da Lei nº 13.281/2016.
Nesse artigo, abordamos os seguintes tópicos:
A Lei Seca no Código de Trânsito Brasileiro: infração ou crime? Veja as hipóteses e punições correspondentes.
Inicialmente, para adentrar nas peculiaridades da aplicação da Lei Seca, faz-se necessário analisar o conteúdo do Código de Trânsito Brasileiro, mais especificamente os artigos 165 e 306 daquele diploma legal.
Isso porque, de acordo com o texto legal, o ato de beber e dirigir pode ser considerado infração ou crime.
De acordo com o artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro, constitui infração gravíssima dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.
Como punição, há a previsão de multa (dez vezes) e suspensão do direito de dirigir por doze meses. Ademais, pode-se aplicar Medida Administrativa, correspondente ao recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo, conforme o caso.
Já o artigo 306, do Código de Trânsito Brasileiro, dispõe que constitui crime conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência. Nessa hipótese, diferentemente do que ocorre com o artigo 165 acima mencionado, a pena do condutor será a detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
As condutas previstas como crime podem ser constatadas por concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora.
Por seu turno, a Lei nº 13.456, de 19 de abril de 2018, acrescentou um parágrafo ao referido artigo 302 (§ 3º), para determinar a aplicação de pena de reclusão, de 5 a 8 anos, assim como a suspensão ou proibição de obter habilitação para o agente que conduzir veículo sob influência de álcool.
Além disso, acrescentou ao artigo 303, do Código de Trânsito Brasileiro, o § 2º, que dispõe que, em casos de homicídio culposo ou lesões corporais graves ou gravíssimas, em decorrência da condução de veículo sob efeito de álcool, a punição é mais severa.
Aplica-se como punição a pena de reclusão de 2 a 5 anos, sem prejuízo das outras penas previstas acima mencionadas.
Fiscalização da Lei Seca
A fiscalização e autuação nos moldes da Lei Seca é efetuada pelos policiais de trânsito, sendo que, nas rodovias federais, o procedimento é realizado pela Polícia Rodoviária Federal.
Em se tratando de rodovias estaduais e cidades, o Departamento de Trânsito e a Polícia Militar são os responsáveis pela fiscalização.
Onde tem Blitz da Lei Seca? É possível divulgar os locais?
A partir das mudanças sofridas pela legislação, que se tornou cada vez mais severa, o Poder Público tem intensificado sobremaneira a fiscalização do trânsito.
Os governos estaduais, essencialmente, criaram diversos programas especiais para planejar blitzes nas capitais e outras cidades importantes.
Como exemplo, podemos citar as operações Lei Seca RJ, do Rio de Janeiro, Direção Segura, em São Paulo, e Balada Segura, no Rio Grande do Sul.
Os locais e horários em que ocorrerão as operações de fiscalizações (blitz) não são divulgados previamente e não podem ser sempre os mesmos, de modo a preservar o caráter surpresa das operações e sua eficiência.
De outro modo, os condutores, ao saber previamente seu local e data, buscariam caminhos alternativos para evitar as vias e não serem pegos na fiscalização do trânsito.
Por óbvio, tem-se como ideia evitar que se difunda a sensação de impunidade daqueles infratores que colocam a sua e a vida de terceiros em risco.
Ainda assim, muitos condutores buscam meios de burlar as blitzes, buscando formas alternativas e com auxílio da tecnologia para descobrir e divulgar os locais onde há operações da Lei Seca.
A internet e as redes sociais contribuem muito nesse sentido, pois indivíduos se utilizam de perfis para esta divulgação.
Atualmente, existe um grande debate sobre a legalidade desses perfis que informam onde ocorre a fiscalização da Lei Seca.
Por um lado, a Constituição Federal garante o direito à livre expressão da informação. Em seu artigo 220, dispõe que não deve sofrer qualquer restrição à manifestação do pensamento, expressão, criação e informação.
Ademais, a Carta Maior assegura a todos os brasileiros o livre acesso à informação, conforme o inciso XIV do artigo 5º.
Com base em tais dispositivos constitucionais, alguns alegam não ser um ato de descumprimento legal divulgar os locais de realização de tais fiscalizações.
No entanto, por outro lado, tal conduta pode ser considerada crime se entendida que afronta o artigo 265 do Código Penal, o qual prevê pena de 1 a 5 anos de reclusão e multa para quem atentar contra a segurança ou funcionamento de serviços de utilidade pública.
Vale dizer que em determinados Estados brasileiros, já se tratou como crime a prática de informar sobre o local das blitze, como Minas Gerais e Espírito Santo.
Essa interpretação, porém, não é consenso entre os entes públicos.
De modo que, em vista de tal polêmica, tem-se que informar sobre os locais de blitz da Lei Seca pode, de fato, ser considerado crime e, por este motivo, não é adequado compartilhar tal tipo de informação.
Qual o tempo necessário para dirigir após beber?
No caso de ingestão de bebida alcoólica, o tempo médio, em geral, indicado pelos profissionais da área é de, ao menos, 12 horas para conduzir qualquer veículo.
Tal período pode, contudo, variar, a depender do indivíduo e das condições de consumo.
Teste do Bafômetro: como funciona? É obrigatório?
No momento da abordagem em uma fiscalização da Lei Seca, mais conhecida como blitz, o mais provável é que o agente fiscalizador, em algum momento, proponha que o condutor faça o teste do bafômetro.
Pelo teste do bafômetro, ocorre a captura do álcool presente no ar que é expelido pelos pulmões.
A dúvida surge quanto à obrigatoriedade, ou não, de realização do teste do bafômetro, pelo condutor do veículo.
De acordo com a Constituição Federal de 1988. o cidadão não é obrigado a produzir provas utilizadas contra si, tornando a lei do Código de Trânsito Brasileiro inconstitucional.
No entanto, na forma estabelecida pelo Código de Trânsito Brasileiro, o motorista que se recusar a realizar o teste de bafômetro deverá pagar uma multa no valor equivalente a R$ 2.934,70 reais e, também, terá sua carteira suspensa pelo período de doze meses.
De modo que nos casos em que o motorista do veículo se recusar a realizar o teste do bafômetro e sejam identificados, pelos policiais ou agentes, de forma visível, sinais de embriaguez, o condutor deverá ser encaminhado ao Instituto Médico Legal (IML) para a realização de um exame de sangue.
Lembre-se que o teste do bafômetro não é a única forma de prova prevista no Código de Trânsito Brasileiro para fins de comprovação de descumprimento da Lei Seca!
Cumpre alertar que o bafômetro pode apresentar erros no momento da medição da quantidade de álcool presente no organismo do condutor.
Dessa forma, o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia – INMETRO, admite, para a aprovação do aparelho, uma margem de erro possível de ser apresentada no resultado da medição.
Como o bafômetro mede a quantidade de álcool por litro de ar alveolar, 0,01 mg de álcool por litro de ar alveolar é suficiente para que o condutor seja autuado pela Lei Seca. Todavia, deve-se levar em conta a margem de erro indicada pelo INMETRO, que é de 0,04 mg/L.
De modo que, para o resultado do teste do bafômetro implicar em conduta sujeita à punição do condutor, o teste deverá acusar resultado de, pelo menos, 0,05 mg/L.
Como comprovar o uso de drogas pelo condutor do veículo?
A Lei Seca, como visto, dispõe que é proibido dirigir após consumir, além de bebidas alcoólicas, qualquer outra substância psicoativa que cause dependência, o que inclui as drogas ilícitas.
Todavia, em uma blitz, a forma de comprovar que o condutor do veículo fez uso de drogas antes de dirigir não ocorre por meio do bafômetro.
Para tanto, é necessário se valer de outras formas de identificação da presença de tais substâncias no organismo do condutor, tais como exames clínicos e a constatação por parte do agente fiscalizador de sinais de alteração no condutor, na forma prevista em lei.
Como recorrer da multa da Lei Seca?
É possível, ao condutor, recorrer da aplicação de multa por infração à Lei Seca, baseado no direito de defesa previsto na Constituição Federal de 1988.
É possível, ao condutor, que providencie, inicialmente, sua Defesa Prévia
Caso o órgão responsável pela análise do pleito não acate a Defesa Prévia, o condutor pode se valer de recurso à instância superior do órgão.
É possível pagar fiança ao ser preso com base na Lei Seca?
Como mencionado, uma vez configurada a possível ocorrência do crime previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, ele pode ter de cumprir pena de 6 meses a 8 anos de detenção, dentre outras penalidades previstas na norma legal.
Porém, uma vez detido sob tal hipótese, existe a possibilidade de liberação do condutor de veículo mediante o pagamento de fiança.
Isso porque o artigo 322, do Código de Processo Penal, estabelece a possibilidade de concessão de fiança a casos em que a condenação seja de, no máximo, quatro anos de detenção.
E, uma vez que o aludido artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro prevê detenção de até três anos para algumas situações, o motorista penalizado tem direito ao pagamento de fiança, se for condenado por crime de trânsito referente à infração à Lei Seca.
O valor da fiança deve ser fixado pelo delegado responsável pelo caso, o qual poderá determinar o pagamento de um a até cem salários mínimos para que o condutor seja liberado.
O que ocorre em caso de reincidência em Multa da Lei Seca?
Nesse ponto, vale verificar o que determina o parágrafo único do artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro, que traz o procedimento a ser aplicado em caso de motorista reincidente na infração descrita pela Lei Seca.
Na forma da lei, configura-se situação de reincidência quando se comete a mesma infração dentro de um período de doze meses.
Nesse caso, o Código de Trânsito Brasileiro tem por intuito impor penalidades maiores, visto que o condutor voltou a cometer a mesma infração no trânsito em um espaço curto de tempo.
No caso do artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro (infração), restou estabelecida a duplicação do valor inicial da multa por conta de dirigir embriagado.
Ou seja, uma vez o condutor sendo flagrado dirigindo sob influência de álcool pela segunda vez no período de doze meses, a multa aplicada será de R$ 5.869,40.
Mas não é apenas a aplicação de multa majorada que o condutor infrator reincidente pode sofrer no âmbito da Lei Seca.
Isso porque o artigo 263 do Código de Trânsito Brasileiro prevê, ainda, a cassação da Carteira Nacional de Habilitação – CNH, de motorista que for reincidente na infração descrita pelo artigo 165 mencionado anteriormente.
A Lei Seca no exterior
Para aqueles que pretendem conduzir veículos no exterior, cumpre trazer informações genéricas e resumidas sobre a aplicação da Lei Seca em alguns países:
– Estados Unidos: tolerância de 0,8 gramas de álcool na corrente sanguínea.
– Inglaterra: tolerância de 0,8 gramas de álcool na corrente sanguínea e aplicação de multa pecuniária elevada.
– França: limite de álcool no sangue que ainda não gera punições ao condutor é de 0,5 gramas por litro de sangue.
– Rússia: não é tolerável qualquer quantidade de álcool no sangue do condutor de veículo. Pena de perda do documento de habilitação por 10 anos e de 12 meses de trabalho voluntário.
– Japão: não é tolerável qualquer quantidade de álcool no sangue do condutor de veículo. Aplicação de pena de detenção e suspensão permanente da habilitação do motorista infrator.